Criada em outubro de 2000 para oferecer apoio social e psicológico às
crianças e adolescentes com câncer e suas famílias, a ONG Núcleo Esperança vem desenvolvendo trabalho praticamente anônimo em defesa dos portadores da doença. Dirigido por Válber Queiroz, a entidade já atende mais de 400 crianças e adolescentes com câncer, bem como seus familiares, de diversas outras localidades. A ONG presta serviços de acompanhamento sem qualquer apoio financeiro do poder público, mas com a ajuda da sociedade, de familiares e de pessoas que viveram ou vivem drama semelhante.
ENTREVISTA – Patrícia Gramacho
Contar a verdade é a melhor opção, sobretudo, em casos de câncer terminal. Muitas vezes, a criança monta fantasias tanto quanto ou mais aterrorizantes do que a própria realidade sobre sua situação.
Como vocês lidam com pacientes que estão passando pelos cinco estágios de um paciente terminal?
Os estágios de Rubler Ross (negação, barganha, revolta, depressão e aceitação) são considerados estados psicológicos que não se referem apenas a situações de terminalidade. Sabemos que hoje, apesar dos avanços científicos, o câncer ainda carrega o estigma de sofrimento e morte. Conseqüentemente, esses estados psicológicos são dinâmicos e estão sujeitos às intercorrências que a evolução da doença, tratamento e a vida do paciente apresentarem no decorrer do acompanhamento psicológico. Cabe ao psicólogo, enquanto elemento da equipe, detectá-los para poder discriminar o que é reativo do paciente e o que pode ser melhorado a partir da intervenção e maior clarificação de algum elemento da equipe. Este é o maior desafio: trabalhar de forma interdisciplinar.
Que tipo de repercussões psicológicas os pacientes infantis de câncer enfrentam?
A criança terá mais repercussões negativas do tratamento a partir do instante em que não são clarificadas quanto ao diagnóstico e tratamento, partindo-se do pressuposto de que a criança sofrerá mais ao tomar conhecimento das situações a serem enfrentadas. Conseqüentemente, a criança fica só com suas fantasias, que muitas vezes são mais aterrorizantes do que a realidade. Conversar com a criança é fundamental, transpondo esta difícil realidade com palavras acessíveis à sua compreensão.
Há alguma diferença em relação às reações dos adultos? Quais?
Muitas. No trabalho com crianças estamos sempre lidando com uma tríade (pai, mãe, criança) inclusive presente no mesmo espaço hospitalar. Pela lei dos direitos das crianças a presença de um acompanhante é sempre imprescindível. Porém, muitas vezes esse acompanhante mina toda a positividade presente na criança. Os pais ficam também abalados na sua capacidade enquanto responsáveis. A tentativa de ocultar a verdade por parte dos familiares é maior com relação a crianças do que com adultos doentes de câncer. O adulto carrega também uma carga mais negativa com relação à doença; já as crianças são mais positivas (quando os pais o permitem).
Que tipo de reação seria a mais adequada a famílias que acabam de receber a notícia de caso de estágio terminal?
A morte é difícil em qualquer idade, pois são muitas as despedidas. Um espaço para a expressão da dor é fundamental para a família e uma integração com recursos psicológicos e espirituais (no sentido de permitir a expressão da fé de cada um) é fundamental. A presença constante de toda a equipe, quando a morte acontece no ambiente hospitalar, diminui a sensação de abandono e reforça os laços enquanto rede social de apoio. Quanto à criança, é importante que ela possa expressar sua angústia, seja brincando, desenhando, pintando, ouvindo estórias. O vínculo anterior com a psicóloga é fundamental para que a sensação de amparo permaneça até o momento final.
Fonte: http://www.tribunadeanapolis.com.br/modules.php?name=News&file=article&sid=591